“Logo, não basta, hoje, vivenciar algo, é preciso transpor a rede e, em vez de entrarmos na TV, queremos sair das telas dos computadores, smartphones e tablets.”
Quando o filme Matrix foi lançado em 1999, muitos ficaram maravilhados com todas aquelas cenas intrigantes de homens e mulheres ferindo, deliberadamente, as leis da física. Na obra, à contragosto dos professores, os personagens param o tempo como se apertassem um cronômetro e, assim, desarmam seus oponentes; movimentam-se mais rapidamente que uma bala, de modo a preservar a sua integridade física e, de quebra, saltam distâncias inimagináveis por entre prédios da urbe.
A realidade paralela na qual humanos são tratados como fontes de energia, e que, para interrompê-la, basta tomar uma pílula, de sorte a ganhar ciência dessa distopia, logo ganhou milhões, quiçá bilhões, de fãs.
O homem-médio sempre se interessou muito por histórias fantasiosas. A prova disso é a evolução hollywoodiana do coelhinho da páscoa e papai Noel para o ser de um outro planeta, conhecido pela sigla ET. Vale dizer que Matrix retrata com perfeição apenas uma das modalidades da neutralização psíquica a qual, individualmente, elegemos. Algumas outras são: álcool, drogas ilícitas, remédio de tarja preta, e por aí vai. Em que pesem essas modalidades atuarem de forma distinta no organismo, o propósito é o mesmo: afastar-se de nossa realidade, ainda que momentaneamente. As redes sociais, por exemplo, são outra espécie muito semelhante às citadas. A própria Netflix entrou nessa competição por “fontes de energia” – algo extremamente lucrativo. Foquemos, conquanto, nas redes sociais.
As redes sociais, após anos do seu surgimento, já suscitaram diversas discussões e debates sobre a influência no comportamento (real) das pessoas. No Brasil, em especial, com o acirramento político em voga, não é raro encontrarmos discursos contra parlamentares e demais autoridades no sentido de desqualifica-las perante os amigos (virtuais).
Porém, esse movimento aguerrido de ataques digitais vem ganhando outros contornos nos últimos tempos. Somado às redes sociais, principalmente, a do americano Mark Elliot Zuckerberg – em coparceria com o brasileiro Eduardo Saverin -, os celulares transformaram-se em verdadeiros dispositivos oculares de guerra. Nessa perspectiva, o homem contraia a pirâmide de Maslow e, sem cerimônia, as suas necessidades básicas dão lugar ao smartphone de última geração. Como ensinam os teóricos da Administração, não cabe fazer julgamento dessa gama de escolhas, mas apenas buscar compreender essa tendência.
De qualquer forma, que fique claro: as redes sociais são como uma Matrix. Isso se prova por uma série de acontecimentos noticiados mundo a fora. O primeiro deles, é a ocorrência em que um sujeito resolveu interpelar representantes da CBF em um restaurante, preferindo-lhes acusações. Em troca, recebeu, de um assessor da organização, um copo na cabeça. Na sequência, foi alvo de comentaristas de notícias. Um deles, inclusive, sarcasticamente, disse: achou que falar no Face (em alusão à rede social Facebook) é o mesmo que face to face (cara a cara)?
Já em outro caso, muito macabro, uma usuária da rede social Youtube decidiu, em tom de desafio, dar um tiro em seu namorado. O resultado disso: um jovem morto e despejado no limbo entre o mundo real e o virtual.
É importante ressaltar que propostas com traços de competição são muito apreciadas pelo usuário da internet. Isso porque, graças a ela, o internauta tem a oportunidade de ver e rever tudo aquilo que a sua vida pacata (e não raro curta) ainda não lhe mostrou – e, talvez, nunca o mostrará. Assim, com essa rede de contatos e informações, alijam-se as chances de se sentir desinformado, desconectado e, sobretudo, inexperiente. Com a internet, esse grupo de referência, além de aumentar, brutalmente, o leque de suas experiências (virtuais ou reais?), aceleram, exponencialmente, o consumo delas.
Logo, não basta, hoje, vivenciar algo, é preciso transpor a rede e, em vez de entrarmos na TV, queremos sair das telas dos computadores, smartphones e tablets. Ou seja, é como no filme O Chamado em que uma menina sai de uma televisão e assusta todos. Aqui, por outro lado, o desejo unânime é de que tudo aquilo constatado no instagram (‘estragam’) se torne realidade: corpos mais esbeltos, viagens mensais para a Europa, namorado que entrega flores no trabalho etc.
Por muito tempo, as redes sociais foram apontadas como um trampolim do marketing individual. Todavia, a contemporaneidade revela que elas não têm limites e instigam, cada vez mais, o seguinte questionamento: será que passamos a viver uma “matrix”?
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